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Todos os dias o vejo no metro. Curioso, isso: Sei que não está lá mas encontro-o por uns instantes todos os dias. Assemelha-se a rezar, a acreditar cegamente por momentos.

 

Gosto de andar de costas nos autocarros, no metro, nos comboios. Ver o que já foi visto muito antes pelos outros, o que por eles já foi descartado, o que já não tem ou nunca verdadeiramente teve interesse. A poesia está aí.
O rosto que esmoreceu ao avistar um novo edifício desinteressante, o rosto que se iluminou quando viu o reflexo de uma fêmea alourada a folhear um livro de romance mau, a felicidade momentânea de quem primeiro avista a luz ao fundo do túnel, o mar que depressa se aproxima. As pessoas que caminham, as que esperam, o deixar cair de uma moeda e o simpático gesto de a apanhar e devolver. O carteirista pouco habilidoso. A velhota que se enche de cobiça e conta notas como em Crime e Castigo. A bengala perdida que atrás traz um ser humano debilitado. Toda uma fauna, toda uma palete de histórias, que quem viaja 'de frente' não repara. Prefiro adolescentes apaixonados a horas e nomes de estação. Prefiro, às vezes, tem dias. Se calhar é por isso que chego sempre atrasada.

 

 

publicado por verbistantum às 18:54 | link do post | comentar | ver comentários (2)