Hoje

Depois de ouvir um sonho vim fazer parte de outro. Há qualquer coisa que em algumas peças de música clássica faz despertar sensações estranhíssimas em mim. Não me lembro de pessoas mas revisito sensações. Sentada no Grande Auditório a ouvir violinos, violoncelos, clarinetes, vozes e demais instrumentos que cantavam a minha vida apercebi-me que estava rodeada de pessoas que ouviam aquela música de uma maneira muito própria, muito delas. Cada nota e cada nuance despertava nelas uma diferente sensação, causava uma mudança de expressão ou nada disto acontecia e estavam a apanhar uma grande seca. Pois eu chorei. Não sei exactamente qual foi o momento em que senti uma lágrima na mão, mas sei que a senti. Foram duas, a outra foi impedida de escorrer pelo rosto. E não chorei por me ter lembrado de alguém ou por estar triste, chorei por mim e pela música. Sou pequena, muito pequenina neste universo. Sou um nada que se emocionou sem perceber bem porquê. Acho que chorei por quem não sou mais. Ou talvez tenha sido por quem não é mais. Foi um belíssimo concerto, fico feliz por ter comprado o bilhete, fico feliz por ter lá estado. E agora não sei, não sei que história escrever nem que palavras usar. Perdi-me em notas que não sei ler e em sonhos que eram vazio. A frase \'estou aqui para si\' é lamentavelmente pouco usada por mim na vida real. Porque não há muita gente pela qual tenha um carinho tão grande que mereça que esteja aqui sempre que precisem. Gostava de saber quem está do outro lado para mim, quem me abraçava se eu lhe pedisse e quem me mostrava música enquanto me escrevia. Às vezes é difícil, às vezes sinto falta de ler e ouvir palavras escritas para mim, que vinham do que há de mais profundo, do sítio onde ninguém ia já há muito tempo. Uma nostalgia falsa que aparece de vez em quando. Falo muito para o ar, para as paredes que ouvem mas não respondem, e normalmente não me incomoda fazê-lo. Mas de vez quando... de vez em quando o mundo ganha e esmaga-me como a formiguinha tonta que acha que consegue trazer a folha inteira sozinha para o ninho que sou. Acho que é tudo o que consigo escrever hoje. Até porque não tenho nada a dizer, a partilhar, porque nada existiu. Não é muito e nem sequer está bem escrito, mas está aqui. Escreverei em breve o que é para mim um \'Sonho de uma noite de Verão\'. Eu estou aqui. Estou aqui para si, sempre. Abraços apertados - esses são o meu comprimido para dormir bem.

publicado por verbistantum às 00:24 | link do post | comentar | ver comentários (2)