Conversas

Se eu não ouvir o vento será que ele deixa de existir ? Se não o sentir na cara será que não está lá ? Se fechar os olhos será que as árvores deixam de balançar ?
Quando ouvia o seu nome, o que ele lhe tinha dado, o que era o verdadeiro, sentia o coração a bater como se espereasse que quem o vocalizava fosse quem lho deu e sentia o ar a sair dos pulmões. Era uma reacção estranha, que não fazia muito sentido, mas que a fazia lembrar cheiros, sorrisos, toques. E depois respirava, e fundo, e o sorriso aparecia. A distancia era nada, o tempo nada era. A conversa continuaria, a vida também; mas aquelas pequenas reacções que apareciam como fotografias que captavam mais de um momento de uma memória que só existe no sonho paravam o instante real em que ela se encontrava.
Dançou com quem dela gostava, com quem ela achava simpático, com quem partilhava aquele sentido de humor que ninguém percebia bem. Falaram de filmes mas ele não conhecia os de que ela falava. Falaram de livros mas ela não tinha interesse nos que ele dizia serem bons. Falaram de música e de nada falaram porque música não sabia ele o que era.
Beberam, falaram do pouco mais em que concordavam e foram para casa. O beijo na cara e a promessa de um encontro futuro que nunca acontecerá - talvez por isso ele lhe tivesse desejado em segredo que encontrasse alguém que a compreendesse melhor. 'Foi divertido, obrigada.'
Há pessoas neste mundo que merecem encontrar quem as ame. Ele era uma delas, e tinha a certeza que amaria quem a ele se entregasse e quem o compreendesse. Não era ela, mas o importante era que tinha aprendido alguma coisa.
Chegou a casa tarde, mas era um tarde relativo, para ela ainda era horário normal, para os outros era o início de mais um dia neste mundo que não é o seu. O suspiro e o descalçar dos sapatos marcava o fim de uma noite que já tinha caído no esquecimento. Agora,  que estava no seu canto, confortável e a ouvir quem  cantava a sua vida, escreve.
Escreveu sobre sonhos mas enquanto os escrevia adormeceu. Acordou e estava a seu lado, com a cabeça pousada no seu ombro, com os braços a agarrarem o seu. Tinha a sua mão na barriga, a perna direita em cima das suas. E sentia os seus dedos quentes, a sua palma da mão macia a encontrar descanso na pele que queria há tanto que fosse tocada por si. Desencostou-se e começou a beijar cada pequeno pedaço de si que encontrava no caminho. Cada pequeno beijo e cada pequeno pousar de lábios que não chegava a ser um beijo aproximava-os mais, mais e mais. Até que ela chegou aos seus lábios, já cheia de si, e quando se inclinou para o beijar, quando o seu peito e o dela eram só um, quando os corpos estavam quentes e as palavras não eram ditas mas sim suspiradas, acordou.

publicado por verbistantum às 06:37 | link do post | comentar