Vapor
Portanto, já deviam ter passado os dez minutos. Não tinha bem noção do tempo mas mergulhada em tudo aquilo, pensamentos à deriva, tinha tido tempo para se libertar das tensões que o corpo se tinha negado a deixar ir. O lençol ainda se colava às suas costas suadas e os seus lábios ainda pediam para ser sugados, saboreados uma vez mais. O som da água a bater na porcelana e o vapor que sentia no ar viajava pelo corredor até chegar ao quarto.
Sentou-se na cama, pôs os pés no chão e antes de se levantar viu os vergões que o lençol tinha deixado na sua pele. Os dedos dormentes começavam agora a recuperar a circulação, o que a fez tropeçar e equilibrar-se no parapeito da janela. Sentia-se a flutuar, mas não no bom sentido, por isso esperou até sentir as pernas outra vez - não queria arriscar magoar-se agora. Não tinha pressa, sabia que ele estava à espera. Fechou os olhos e o sorriso que ele lhe tinha dado apareceu nos seus lábios. 'Sei que está à minha espera.'
Caminhou até à porta do quarto, a luz vinda da janela que estava por cima da porta da casa de banho iluminava o corredor de uma maneira diferente. Mais direccionada, mais misteriosa que a bebedeira de luz que tinha no quarto, que nem os cortinados conseguiam conter. A contínua trovoada quente que se deixava ouvir pela porta entreaberta e o vapor que via no ar estimulavam a sua curiosidade. Queria vê-lo, sentia-o relaxado, feliz, jovial. Não era um lado que já tivesse visto muitas vezes. Não desta forma.
Dois passos no corredor e as sensações continuaram a deixar-se conhecer, como lâmpadas a acender e a apagar denunciando mau contacto. Conseguia ouvi-lo a murmurar agora, a cantarolar. Reconheceu a música. O que ele tinha ido escolher... a música que ele lhe tinha mostrado e que se tinha tornado 'a música'. A que sempre que algum deles a ouvisse pensaria no outro. Estava feliz, era tão bom saber isso.
Pontas dos dedos a passear pelas paredes do corredor, tocando nas molduras e fotografias que tinha sem dúvida pendurado com muito carinho numa ou noutra altura da sua vida. Não seguiam nenhum tema ou ordem especial, nem tinham de seguir. Eram dele e ela podia vê-las. Uma verdadeira honra; Para ela era, admirava-o e considerava-se uma priviligiada por poder estar com quem sabia tanto e mesmo assim a achava interessante. Era um exagerado, era um bocadinho, mas fazia parte do seu charme. Gostava dos exageros dele e ele sabia que palavras usar para a fazer corar. Não eram precisas muitas, só as certas, ditas da maneira certa.
As pernas dele estavam agora visíveis, ela estava a meio do corredor e já conseguia vê-las pousadas na banheira, a descansar. Abriu a porta e viu as mãos dele fora da banheira, dedos molhados contornados por veias que ganharam relevo, ali à sua espera. Sentou-se no tapete cor de carne ao lado da banheira, olhou para ele e levou a mão dele ao seu rosto. Fria e molhada contra a pele quente e transpirada dela.
'Meu desejo... venha, estava à sua espera. '