Lágrimas de Sereia

Quando alguém magoa uma sereia ela vai ter com quem a ama. Com quem a ama em todos os sentidos da palavra.
Quem a magoava era quem dizia que a amava mais que tudo.  Quem a magoava era quem a prendia ao mundo dos humanos, era o humano que a prendia a si, que insistia que as sereias não existiam, que ela não existia. Estava convencido que as sereias não habitavam os mares azuis profundos, que não se deitavam na rocha isolada das outras, naquela fora de pé, tomando banhos de sol e penteando os seus longos cabelos enquanto (en)cantavam. Estava convencido que estas sereias não eram reais e que se estas não existiam mais nenhuma poderia existir.
A revolta que sentia por quem a fazia sentir assim fazia o mar encher-se dela, alimentava a sua fúria, fúria dirigida a quem tinha ousado magoar aquela parte de si. O vento cortaria a respiração de quem se atreveu a fazer uma alma tão especial sentir-se assim, o nevoeiro não o deixaria ver o quanto magoada ela tinha ficado e as ondas que batem na rocha disfarceriam os ecos do seu choro. Sugaria e destruiria os que se atrevessem a tentar entrar em si, predador de humanos que procuravam os seus encantos e protector de quem os compreendia.
E quando a raiva por quem a magoou acalma, quando se apercebe que só ela importa, faz-se gordo para ela, faz-se cama para a aconchegar, faz-se fundo para a poder abraçar. Como a ama, mais do que se ama a si mesmo, diz-lhe coisas lindas, fala-lhe do quão especial ela é e limpa-lhe as lágrimas de dor, trocando-as por sorrisos de ternura.
E aí a sereia sente-se amada, sente-se compreendida e sente-se segura. O mar compreende as sereias, percebe esta em especial porque é parte dele.

Ao meu mar deixo o meu coração, a si, que me lê, deixo um profundo sentimento de agradecimento. Porque sem si as minhas noites seriam como as dos outros, porque temos o nosso mundo, que é nosso e só nosso, mesmo que nunca (mais) falemos um com o outro.
Porque volta para mim todas as noites, um sincero Obrigado.

"There are two ways to reach me: by way of kisses or by way of the imagination. But there is a hierarchy: the kisses alone don't work." - Anaïs Nin, Henry and June

publicado por verbistantum às 03:17 | link do post | comentar